De rejeito ao produto comercial, caulim se torna exemplo da mineração sustentável

De rejeito ao produto comercial, caulim se torna exemplo da mineração sustentável

Na indústria mineral, especialmente no processo de beneficiamento de caulim, os rejeitos sempre representaram um passivo crítico, tanto pelo risco ambiental quanto pela disposição geotécnica. No entanto, atualmente, a mineração não se limita apenas à extração de novas jazidas, mas também à inteligência de aproveitar ao máximo os recursos já disponíveis, onde a nova frente de lavra não está mais na extração do minério bruto, mas sim na recuperação dos rejeitos. Esse conceito, antes inimaginável, tem ganhado força e se consolidado como uma solução sustentável e economicamente viável no setor mineral.

A Artemyn, anteriormente Imerys, iniciou suas operações em março de 1996, localizada em Barcarena-PA, região Norte do Brasil, uma área de significativa abundância mineral e infraestrutura logística favorável à extração e distribuição. Desde sua implantação, o empreendimento tem sido um catalisador do desenvolvimento socioeconômico local, promovendo a geração de empregos, a capacitação da mão de obra regional e a modernização da infraestrutura, fortalecendo, assim, a economia da região.

Atualmente, a Artemyn se destaca como a maior planta de beneficiamento de caulim do mundo, com uma capacidade produtiva anual de 1,2 milhões de toneladas e um portfólio diversificado, composto por mais de 7 tipos de produtos. No entanto, até recentemente, nenhum desses produtos incorporava uma abordagem sustentável. Esse cenário começou a se transformar com a adoção de práticas alinhadas aos princípios da economia circular, culminando no desenvolvimento do WH – Working Horse, um produto inovador que reflete o compromisso da empresa com a sustentabilidade e a eficiência no uso de recursos naturais.

O WH é um blend (mistura) no qual 50% da composição provém de material reaproveitado da bacia de rejeitos. Esse material passa por uma rota alternativa de processamento, desenvolvida para garantir qualidade e desempenho equiparáveis aos dos produtos tradicionais. O projeto sobre o novo produto a partir de rejeitos foi iniciativa da equipe da Artemyn, formada pelo coordenador de Produção, Roberto Silva, do gerente de Produção e Bacias, Gilberto Correa e o trainee de Engenharia de Processos, Luan Victor Mourão.

COMO FOI DESENVOLVIDO O PRODUTO A PARTIR DE REJEITOS

Segundo os autores, o reaproveitamento do rejeito da Bacia 3 da Artemyn foi realizado por meio de uma rota de beneficiamento dedicada, estruturada com base em estudos de caracterização físico-química e mineralógica do material depositado. Esses estudos indicaram que o rejeito apresentava características compatíveis com a rota convencional de processamento, desde que submetido a um ajuste operacional e blendado com frações de menor granulometria.

Foi então que a partir da captação controlada na bacia, o material foi encaminhado para a etapa de recebimento, onde ocorre a homogeneização inicial. Em seguida, ele passa por um sistema de blendagem para ajuste da distribuição granulométrica e da reologia da polpa.

A separação sólido-líquido é realizada por centrifugação, segregando os finos com potencial de aproveitamento. Esses finos seguem para uma etapa de separação magnética, destinada à remoção de contaminantes ferromagnéticos, e posteriormente para a filtragem, que reduz o teor de umidade.

Após a filtragem, o material passa por moagem e peneiramento, assegurando a conformidade com as especificações granulométricas do produto final. Por fim, o material é submetido ao alvejamento, etapa responsável pelo aprimoramento das propriedades ópticas, resultando em um produto com desempenho técnico equivalente aos caulins tradicionais.

GANHOS AMBIENTAIS E ECONÔMICOS

O reaproveitamento de rejeitos representa um avanço estratégico para a mineração sustentável, combinando ganhos operacionais, ambientais e de segurança. A introdução do WH reduz o descarte de materiais que antes eram considerados sem valor. Esse processo reduz em até 5% a necessidade de extração de matéria-prima virgem, minimizando impactos ambientais e otimizando recursos naturais.

Além disso, a diminuição na movimentação de materiais pode reduzir as emissões de CO₂ em até 3%, dado que menos insumos são transportados e processados. A eficiência energética da planta também é aprimorada, uma vez que a reutilização dos rejeitos permite uma economia de até 15% no consumo de energia em comparação com rotas tradicionais.

A implementação desse produto começou a apresentar números expressivos para a Artemyn já no início de 2025. Nos meses de janeiro e fevereiro, a produção total da planta foi de 120 mil toneladas, sendo 4mil toneladas de WH. Isso representa 3,33% da produção acumulada, um marco importante para um projeto recém-implantado.

Além do impacto ambiental positivo, esse avanço gerou uma economia financeira superior a R$600 mil, mostrando que a sustentabilidade também pode ser um excelente negócio. Com uma projeção anual de retorno financeiro de R$ 2 milhões e um ROI de 0,5, a empresa não só reforça seu compromisso com práticas responsáveis, mas também demonstra que a implementação de soluções sustentáveis resulta em benefícios econômicos substanciais, consolidando a viabilidade financeira do modelo.

O empreendimento impacta diretamente mais de 1.400 colaboradores, incluindo os funcionários da Artemyn e terceirizadas. Indiretamente, estima-se que outras 1.900 pessoas sejam afetadas, considerando fornecedores e prestadores de serviços. Com base nesses números, podemos estimar que cerca de 10.000 pessoas sejam beneficiadas de forma direta e indireta pela operação, considerando famílias impactadas e seus dependentes.

Além disso, a transformação na cultura organizacional foi crucial para impulsionar a adoção de práticas sustentáveis. A nova administração da empresa, com uma visão mais alinhada aos princípios ESG, incentivou a inovação e diversificação do portfólio.

Do ponto de vista geotécnico, a reutilização dos rejeitos é fundamental para a estabilidade e segurança das bacias de disposição. A remoção contínua desse material pode reduzir em até 10% o volume acumulado, mitigando riscos estruturais e prolongando a vida útil em ao menos cinco anos.

Esse processo também contribui para a conformidade com a Resolução nº 95/2022 da Agência Nacional de Mineração, garantindo a manutenção da borda livre obrigatória e reduzindo significativamente o risco de galgamento durante períodos chuvosos. Como consequência, a operação se torna mais segura, diminuindo a probabilidade de falhas críticas e proporcionando um ambiente de trabalho mais estável para economia de 6.000 litros de diesel e uma diminuição de 19,2 toneladas de CO₂ até o presente momento, com estimativa anual de 240 mil toneladas a menos. Além de beneficiar o meio ambiente, essa economia de combustíveis também contribui para um ambiente de trabalho mais saudável, já que a redução de emissões diminui a poluição do ar.

Embora ainda não tenha sido definido um foco específico para a comercialização do WH, a tendência global aponta para um mercado cada vez mais exigente com relação a produtos sustentáveis. Setores como construção civil, cerâmica ecológica e polímeros sustentáveis têm se mostrado potenciais consumidores desse material inovador. A estimativa é que, com o crescimento dessas indústrias e a demanda crescente por alternativas sustentáveis, o mercado de WH se expanda significativamente nos próximos anos.

A estratégia futura da empresa envolve explorar novos clientes e mercados, especialmente aqueles que buscam alternativas com menor impacto ambiental. Essa abordagem não só fortalece a competitividade da empresa no cenário global, mas também cria novas oportunidades de emprego e crescimento para os colaboradores, impactando positivamente o desenvolvimento econômico das comunidades locais e ampliando o alcance de práticas empresariais responsáveis.

O reaproveitamento dos rejeitos do beneficiamento de caulim representa um marco na transição para uma mineração mais sustentável. O desenvolvimento do produto WH demonstra que é possível aliar inovação, redução de impactos ambientais e ganhos econômicos dentro de um mesmo projeto. A mineração do futuro não é apenas extrativa, mas regenerativa. O que antes era considerado um problema ambiental agora se torna uma solução lucrativa e alinhada às tendências globais de sustentabilidade. E se a nova frente de lavra é a recuperação dos rejeitos, então o WH é apenas o começo de um futuro mais verde e inteligente para o setor mineral.