No X Workshop OPEX 2019 da revista Minérios & Minerales, em maio passado, em Belo Horizonte (MG), o engenheiro Bruno de Paiva Batista, da VLB Engenharia, realizou palestra sobre as técnicas e processos disponíveis que podem ser adaptadas para se reforçar as barragens de rejeito sob condições de risco – aproveitando a experiência acumulada na construção de hidrelétricas ao longo de décadas pela engenharia brasileira.
Os modos de falha de barragens de terra e de rejeitos podem ser resumidos conforme o seguinte, segundo a VLB Engenharia: Galgamento – falha hidráulica, provocando erosão externa na crista, talude de jusante ou pé Erosão interna (piping) – processo que provoca remoção de partículas após estabelecida uma condição de fluxo Instabilização – instabilidade do talude montante ou jusante Liquefação – instabilidade criada pela perda súbita de resistência em materiais, não coesivos, fofos e saturados Nas barragens de rejeito que apresentam níveis piezométricos elevados e nas que não atendem aos critérios consagrados de segurança – ou seja, FS menor que 1,3 para resistência não drenada de pico, ou FS menor que 1,0 – 1,2 para resistência não drenada pós-pico, no caso de materiais suscetíveis à liquefação, poços de rebaixamento forçado do nível d’água podem ser instalados no entorno do reservatório para captar as águas provenientes do lençol freático, reduzindo a contribuição do fluxo vindo das ombreiras.
O artigo 13 da Resolução 4 de 15.2.2019 do Ministério das Minas e Energia determina que “as barragens de rejeito construídas ou alteadas pelo método a montante…deverão ser até 15 de agosto de 2019, adequadas de forma a evitar o aporte de água da bacia de contribuição….”
O rebaixamento controlado da linha freática, por bombeamento, através de poços, deve evitar impactos expressivos no nível de água em meio ao rejeito (que pode funcionar como eventual gatilho). Esse rebaixamento se soma ao efeito da drenagem natural. Há necessidade ainda de estudos hidrogeológicos tridimensionais detalhados.
Colunas drenantes de areia e diafragmas plásticos
Colunas drenantes de areia podem ser executados na praia de rejeitos no reservatório, de modo a interceptar lentes de material impermeável, fazendo a comunicação entre si de rejeitos mais permeáveis, evitando a formação de lençóis suspensos. Elas podem também se conectar com a drenagem no fundo do vale, se esta ti ver sido instalada. As lentes de material impermeável é resultado de lançamentos de rejeito efetuados de forma inadequada anteriormente.
Barreiras impermeáveis formadas por diafragmas plásticos podem ser instalados no senti do paralelo ao eixo da barragem, ao longo da seção longitudinal do vale, servindo para rebaixar a linha freática por meio de perda de carga concentrada nos diafragmas.
Esses diafragmas plásticos são executados com escavadeira, com a limitação de profundidade em cerca de 15 m por causa da lança do equipamento, ou escavados com clam-shell a profundidade maior. É indispensável que o diafragma atinja um horizonte impermeável na base.
Para construção de uma corti na impermeável, existe ainda a injeção de geoacrílico através de tubos extensíveis até a profundidade desejada. É conveniente um projeto-piloto para se avaliar a eficiência do processo.
Berma de reforço e nova estrutura a jusante
A VLB Engenharia aponta que outra medida é a construção de uma berma de reforço a jusante, ao pé da barragem, composto de enrocamento com filtro e transições. O filtro entre o maciço e a berma previne a possível erosão interna em função da elevada superfície piezométrica. Convém executar ainda finger drains — drenos franceses em trincheira.
A construção de uma nova barragem independente a jusante serve para conter a água e a massa de rejeitos em caso de ruptura da barragem existente. Pode ter seção de terra, mista de terra e enrocamento, ou concreto. Da mesma forma, a execução de diques drenantes a jusante — galgáveis — visam distribuir o volume gerado pela ruptura ao longo do vale e pode ter função filtrante, retendo os sólidos, melhorando a qualidade da água.
Essas duas alternativas demandam estudos de ruptura de barragem detalhados e sua execução sofre restrição por causa das vibrações que se propagam durante as obras, as quais podem servir de gatilho para liquefação dos rejeitos depositados na barragem existente. Quando o risco de ruptura é elevado, resta aumentar a distância entre a barragem de rejeitos atual e a posição da nova estrutura.
O exemplo clássico dessa solução adotada foi a barragem de Saluda, em hidrelétrica localizada na Carolina do Sul, EUA, em que a barragem de terra foi executada com materiais sujeitos à liquefação. Foi erguida nova estrutura para contenção a jusante, constituída de barragem de concreto entre a de terra construída anteriormente e a casa de força, e barragem de enrocamento com núcleo de argila nos demais trechos.
Não há solução única aplicável
A palestra da VLB Engenharia conclui destacando que o reforço de barragens de rejeito em situações de risco demanda boa engenharia e planejamento, porque as próprias intervenções propostas podem servir de gatilho para ruptura.
A recuperação das condições de segurança dessas barragens pode exigir um conjunto de técnicas de intervenção, em vista da Os poços de rebaixamento forçado no entorno do reservatório podem ser combinados com a instalação de diafragmas impermeáveis na porção intermediária a montante do reservatório, para rebaixar o nível freático.
heterogeneidade dos materiais encontrados, e a necessidade de minimizar os riscos de perturbação nas vizinhanças da barragem sob risco.
Não há uma solução única aplicável a qualquer barragem — cada uma desta possui características específicas, que precisam ser investigadas e avaliadas para definir as melhores medidas de reforço, tanto do ponto de vista de eficiência quanto de segurança.
Remediação em Saluda incluiu barragens de enrocamento e RCC
No seu paper publicado na conferencia ASDSO, de junho 2002, Paul C. Rizzo, diretor da consultoria que leva seu nome, relata que a parti r de 1989 uma série de investi gações geotécnicas indicaram que a parte principal da barragem de Saluda, na Carolina do Sul, nos Estados Unidos, sofreria liquefação no caso de ocorrer o evento sísmico previsto no projeto. Esse evento se refere à possível recorrência do terremoto de Charleston de 1886, na escala entre 7.1 a 7.3, cujo intervalo previsto é de 650 a mil anos.
A barragem de Saluda é de aterro semi-hidráulico, executado em 1930, mede 2.600 m de extensão, por 70 m de altura, dotada de usina de 206 MW. Seu colapso afetaria 120 mil habitantes, contaminaria a fonte hídrica da região, causando prejuízo econômico na casa de centenas de milhões de dólares.
A solução adotada é designada como barragem seca, a ser erguida imediatamente a jusante da barragem de terra existente, que permanece em seu lugar como estrutura que forma o lago artificial de Murray. A barragem seca será a principal barreira de contenção caso a barragem de terra se rompa, de modo que foi projetada para as condições seca e molhada, e considerando valores de carga que refletem pressões hidrostáticas e de baixo para cima, além de forças sísmicas no senti do horizontal e vertical.
A barragem seca mede 2.600 m com 1.833 m de enrocamento e cerca de 866 m de RCC-concreto rolado e compactado. No desenho original, essas seções de barragem são chamadas de ”bermas“ por não reter água em condições normais. Foram lançados 570 mil m³ de RCC e 1,5 milhão m³ de enrocamento.